Poemas de Ademir Assunção

 



Cavala
para antonio risério e maria angélica abramo lá, onde os dedos são grossos galhos percutindo o couro dos animais & as palavras dissolvem-se no ar antes de vestirem a couraça dos significados lá, onde sóis azuis luzem a noite inteira lábios sorvem o suor sede de saliva — a espada rompe o espelho o sangue ferve, febre vapor quente nas narinas — possuída, ela convoca éguas luas & golfinhos cascos tinem um estranho batuque ranhuras na pele — unhas de lontra cravadas nas costas rainha dos raios a xota risca fogo nas savanas ..... assim é o amor da cavala riscos rasuras talhos de gilete tratados com pétalas de lírios selvagens sampa, 04.0498
A farsa do amor
1 olho seco de cobra morta — chuva muito fina agulhas na carne viva & você diz Amor (velha senha secreta) lambe as feridas com língua de lixa & tranca o trinco da jaula 2 não tente esse truque outra vez seja mais suja meu doce amor espete um alfinete no olho do gafanhoto toque fogo nas asas de um anjo capture vivo um ET & o leve a um talkshow mas não tente prender os lobos quando for lua cheia sampa, 13.11.97
5 Dias Para morrer
para Hector Babenco morreremos loucos, Ana os sapatos novos em cima da mala — mala notte o dia, a pior foto: olhos úmidos no vídeo flashbacks: a virilha imunda do marinheiro os eletrodos frios nas têmporas as pílulas coloridas peixes num aquário cujo vidro quase se quebra toda vez que o tocamos sim, Ana morreremos loucos mas esta noite dormiremos juntos 0199
Poemas extraidos do livro ZONA BRANCA
(clique no link para ler notas sobre o livro)
IN A SILENT WAY
sob efeito do trumpete de miles davis silêncio na casa vazia só um grilo estrila : estrela girando a lâmpada : cigarra rachando a casca silêncio assim há muito não havia
DESOCUPADO
cessa a sirene da cigarra a tarde arrasta cambraias serena a noite desmaia nos braços de um deus : nada a fazer a não ser viver
PEIXES DE LUZ
pessoas fossem peixes de luz fosforescessem sob algas invisíveis no mel do outono nenhum anzol ousasse fisgá-las palavra alguma profanasse a voz do silêncio apenas arrepio de pele eriçar de pêlos crispas d'água: lua mínima ardendo na face pálida do papel
FISHES OF LIGHT
were people fishes of light phosphorescence under invisible algae in the honey of autumn were no hook to dare to snag them no word to profane the voice of the silence only shivering skin hair standing on end briskness of water: minimum moon burning out on the paper's pallid face translated by Charles Perrone
IEMANJÁ, AFRODITE
A leoa tomba sobre a lua refletida na areia, cabeça entre patas. Noite suspensa pela sombra de Urano. Quente, como uma placenta, o oceano envolve minha nudez, lambe, com sua língua de ondas a pele sangüínea do meu pau - carícia forte e feminina - o corpo freme, teso se contorce - molusco de um deus atlântico. A lua eriça um facho prata na escama das águas. Rugido felino, invejosa. - espuma espessa, branca, gozo de colossos: líquido que sai do meu corpo e entra no corpo do mar praia brava, abril 94
YEMAYA, APHRODITE
The lioness tumbles over the moon reflected in the sand, head between paws. Night suspended by the shadow of Uranus. The ocean, placenta-like heat, wraps around my nakedness, and licks, with its tongue of waves, the sanguine skin of my cock - a strong and feminine caress - the body quivers, tense and twisting - mollusk of an Atlantic god. The moon erects a silver torch in the scales of the water. Feline roar, of envy. - thick white frolic of froth, colossal pleasure: liquid coming out of my body and in to the body of the sea translated by Charles Perrone

 

Poemas extraidos do livro OUTRAS PRAIAS, ILUMINURAS, Brasil, 1998.

Leia uma entrevista com o poeta em Balacobaco e
confira a participação do poeta no programa MUSIKAOS da TV Cultura.

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Ademir Assunção - Zona Branca

 

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