Poemas de Sylvia Plath em
LETRAS EM TRADUÇÃO
(antologia de poemas traduzidos), brochura do curso de
tradução de poesia, Depto. de Letras da Pontifícia
Universidade Católica do Rio de Janeiro, Ed. Gráfica da
PUC-Rio, Brasil, 1994, p. 21 a 30.


"ACHAVA QUE NÃO PODIA SER MAGOADA

Achava que não podia ser magoada;
achava que com certeza era
imune ao sofrimento —
imune às dores do espírito
ou à agonia.

Meu mundo tinha o calor do sol de abril
Meus pensamentos, salpicados de verde e ouro.
Minha alma em êxtase, ainda assim
conheceu a dor suave e aguda que só o prazer
pode conter.

Minha alma planava sobre as gaivotas
que, ofegantes, tão alto se lançando,
lá no topo pareciam roçar suas asas
farfalhantes no teto azul
do céu.

(Como é frágil o coração humano —
um latejar, um frêmito —
um frágil, luzente instrumento
de cristal que chora
ou canta.)

Então de súbito meu mundo escureceu
E as trevas encobriram minha alegria.
Restou uma ausência triste e doída
Onde mãos sem cuidado tocaram
e destruíram

minha teia prateada de felicidade.
As mãos estacaram, atônitas.
Mãos que me amavam, choraram ao ver
os destroços do meu firma-
mento.

(Como é frágil o coração humano —
espelhado poço de pensamentos.
Tão profundo e trêmulo instrumento
de vidro, que canta
ou chora.)

(tradução de Mônica Magnani Monte)


BONDADE

A Bondade baila em meu lar.
Dona Bondade, quanta beleza!
As pedras azul-escarlates de seus anéis
Espargem-se nas janelas, os espelhos
Transbordam de alegria.

O que é mais puro que o choro de um filho?
O choro de um coelho pode ter mais ardor
Mas ele não tem alma.
O açúcar cura tudo, diz a Bondade.
Açúcar um fluido necessário,

Seus cristais um pequeno cataplasma.
Ó Bondade, bondade
Colando os cacos com doçura!
Minhas sedas japonesas, desesperadas borboletas,
Alfinetadas a qualquer minuto, anestesiadas.

E lá vem você, com uma xícara de chá
Envolta em fumaça.
O fluxo sanguíneo é poesia,
Impossível estancá-lo.
Você me confia dois filhos, duas flores.

(tradução de Maryluci Prado)


PARALÍTICO

Acontece. Será que continua? —
Minha mente uma pedra,
Sem dedos para segurar, sem língua,
Meu deus o pulmão de aço

Que me ama, bombeia
Dois sacos de poeira
Para dentro e para fora
Não vai

Me deixar piorar enquanto
Lá fora o dia desliza, eterno tique-taque.
A noite traz violetas,
Tapetes de olhos,

Luzes,
Vozes de veludo
Anônimas: — Tudo bem?
O peito duro, inatingível.

Ovo choco, deitado
Todo
Em todo um mundo que não posso tocar
No branco e tenso

Tambor do meu leito
Fotos vêm me visitar —
Minha mulher, morta e imóvel, estola anos 20
A boca repleta de pérolas

Duas meninas
Imóveis como ela, sussurram: — Somos suas filhas
lágrimas tranqüilas
Encobrem meus lábios,

Olhos, nariz e Ouvidos,
Celofane claro
Que não posso quebrar
Em minhas costas nuas.

Sorrio, um buda, todas
As necessidades, desejos
Caem em mim como anéis
Abraçando suas luzes.

A garra
Da magnólia
Por seu próprio aroma entorpecida
Não pede nada da vida.

(trad. de Janayna Couto Gonçalves)"