Sylvio Back
O CADERNO
ERÓTICO
DE SYLVIO BACK

de olho no firmamento


   dragamos
     saliva
horas a fio
  afundamos
     no cio


. . .
Kama Sutra por causa do teu alaúde (escaravelho ígneo) quase fui decapitado
. . .
de quatro mãos e coxas (orvalhadas) seios e boca (vozes sem vezo) pálpebras (imberbes) torpedeiam os jardins do desejo a memória (essa cafetã!) ensaia um sorriso amarelo
. . .
décor e salteado era como irrompíamos pelas nossas cavernas
. . .
siririca pica de pano se não me engano
. . .
reprise noutro rosto deparo com o mesmo halo (technicolor) de quando metíamos um noutro
. . .
69 teta-à-teta
. . .

 

Ed. Tipografia do Fundo de Ouro Preto, MG, 1986

 

Moedas de Luz


terceira visão

apesar do fôlego e do dardejar mecânicos e os dedos em forma de cone (invertido ) a tez reverbera venenos havidos vis-à-vis um fogo-fátuo o holograma do começo
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como se nada tivesse acontecido

mãos caladas aladas taquicardias ardias
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epitáfio

de luto puto
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ela já não estava

detesto reconhecimentos de morgue quem lhe penteou os cabelos (furta-cor estranhamente) ainda me trouxe sua eletricidade (recorrente)
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cinzas

e quando incendiávamos o ar dos pulmões afogando-nos por brincadeira e excitação à tardinha o hálito (hábito) do prazer já será um doce (amaro) simulacro
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Dor(avante)

Toda vez que eu disser: luz, câmara, ação, será como ver-te.
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álbum d'alma

ideograma hieróglifo ícone iluminura ementa o poema antevê o cinema
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nascituro

na tua boca oxigenei-me na tua boceta liquefiz-me
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O incomensurável desconsolo das palavras

Pranto.
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Príncipe Submarino

fui afogar-me num espelho baço nenhum reflexo a não ser o (e)vidente
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Ed. Max Limonad, S. Paulo, SP, 1988

 

A VINHA DO
DESEJO


la chair est faible

não faça coeur douce mon chou rogou o galante não cabe tamanho talude mon bijou suplicou a galante abre ton décor assim de viés mon trésor insistiu o galante je meurs de peur catita a glande petite ma fleur replicou a galante a cuspe de beijos te rego por tudo alegro ton trou sussurrou o galante então me cobre soca mon désir verte o que vir gritou a galante
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Sim

tenho saudades das matinês conversadeiras que emborcavam besteiras não tenho saudades do meu futuro promissor obscuro aberto no anverso do verso não tenho saudades das mil irretocáveis bronhas simil de Jane Russell à mão não tenho saudades das horas ardidas em discussões sobre causas urdidas e perdidas não tenho saudades da impunidade dos vinte antanhos com tantos puta desengaños não tenho saudades da sangria desatada com meninas da rua da sopa do peito e da lua não tenho saudades de quando alma coração corpo sentidos faziam sentido cor ação magma sim
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canto de fodas

descortinei tua mala malévola negro-nigérrima arregacei teu fiofó sem dó negra-nigérrimo espetei teus peitinhos untadinhos negro-nigérrima explorei teus alvéolos pélvicos negra-nigérrimo na gangorra de todas (amoras) o ventre abres à porra soluçante do sabre ansiante negro-nigérrima tuas coxas (luxo calipígio) minhas mãos (fiat lux) ó fumo pidão negra-nigérrimo dedos à glande (à racha) nádegas aos bagos (amaros) de todas as loucas (curras) hordas nuas (e crudas) convertem-se ao êxtase do teu gêiser (licoroso) extremoso negra-nigérrimo
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cisma

vinhei como se fora o sanguinho do nosso ninho
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guardamento

gozar junto sex defunto
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de cor e salteado

hera como irrompíamos pelas nossas cavernas
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são fauno

asas coradas faunos são
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glad gladis

entre nua e o Steinhäger sagram-se abismos e consolos mortalhas in Tränem o espasmo e o orgasmo apenas lóbulos grisés na ante-sala formidável viuvez: expedição ao cu porco porque morto (miroir du film-noir) o caralho extinto e o ansiar besunto deixaram pentelhos no ralo da pia (confetes fétidos) out de mi de ti de si absinto metempsicose tesão
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países baixos

rasguei o sutiã (empáfia vã) rasguei a calcinha (glória de mentirinha) rasguei a meia nylon (negaça em vão) rasguei os lábios (odores sábios) rasguei a vagina (vesga malsina) enjaulei -me
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Geração Editorial, S. Paulo, SP, 1994

 

Yndio do Brasil

poemas de filme


lição de casa

sói em sóis (fumegam) na mata (em technicolor) índios em decúbito ventral esgarçam (lençois túmidos) bruta aragem de vozes (o chão xamã) von-von-tade    voa-voante a fera    (é caraíba)    da morte mortífera cai cai          cal cai           c      a l cai    ai    ai    ai    ai    aiai aicaiaicalai
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tribo kozák (*)

hetá xetá kozák tela de índigos índios hetá xetá kozák memo de indigno cinema hetá xetá kozák mote-fátuo perpétuo hetá xetá kozák a morte é esteta hetá xetá kozák o filme - profeta (*) O cineasta e antropólogo Vladimir Kozák (1898-1979) foi o único a filmar em 1956 os hoje extintos índios Xetás (ou Hetás) do Norte do Paraná.
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o outro

Montaigne: índio é feliz Sertanista: índio quer neocid Custer: índio bom é índio morto Posseiro: índio morto é bom porto Pastor: índio é sátrapa Exército: índio é apátrida Raoni: índio quer carabina Caiapó: índio quer concubina ONG: índio quer nação Garimpo: índio quer aluvião Igreja: índio quer hóstia Índio: o branco é sósia
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footing


run
ronda
	
run
ronda

run
ronda

run
ronda

run
ronda

run
ronda

run
ronda

run
ronda

run
ronda

run
run
run

bororo
Rondon

xavante
Rondon

xokleng
Rondon

caduveu
Rondon

terena
Rondon

ianomami
Rondon

kalapalo
Rondon

camaiurá
Rondon

urubu
Rondon

Rondon
Rondon
Rondon

run
ronda

run
ronda

run
ronda

run
ronda

run
ronda

run
ronda

run
ronda

run
ronda

run
ronda

run
run
run
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Editora Nonada, MG, 1995

 

boudoir



   hosana ao grelo


tudo no grelo é
favo inflável

tudo no grelo é
molusco e clava

tudo no grelo é
hígido e vibrátil

tudo no grelo é
hóstia e tugúrio

tudo no grelo é
mírreo e anseio

o grelo é ninfeu



° ° °
batiscafo a duração do desejo toda carne é erva a duração do desejo toda carne é excesso a duração do desejo toda carne é tirana a duração do desejo toda carne é escarcéu a duração do desejo toda carne é cantárida a duração do desejo toda carne é líquida
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intradução tu bi or not tu bi
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lêmures de Eros falo falésia fiorde nume torque gárgula lume ágata fátuo gólgota
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duce seducere reducere
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o desejo e o que seja amar é putear
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délicatesse sorver todos os teus interstícios — o que couber! sorver todos os teus interstícios — ah!ah!ahhh... abismos! sorver todos os teus interstícios — ah! mor saciez! sorver todos os teus interstícios — oh! dor ubíqua! sorver todos os teus interstícios — quel beau couvert!
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tolo Sísifo a mulher e seus fogos de afago o homem e seu pássaro falaz a mulher e seus gargalos letais o homem e seus solitários ais a mulher e seus mil orgasmos o homem e seu unívoco ocaso a mulher e seus líquidos infinitos o homem e seu fatídico fastio a mulher toda em si o homem tolo Sísifo
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o náufrago ah este corpo-humor sempre tão aquoso ah este cio-cilício sempre tão artífice ah estes lábios-cálice sempre tão carnaválios ah esta hiléia-ígnea sempre tão carnívora ah estes risos-gêmeos sempre tão gemidos ah este túnel-úbere sempre tão netuno ah este corpo-horto sempre tão porto
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Ed. Sette Letras, Rio de Janeiro, RJ, 1999

 

Sylvio Back?

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Û Ý ´ ¥ Ü * e-mail: elson fróes