l(a le af fa ll s) one l iness so (um so l so me) l i dã o Comentário Indevido Rubens Figueiredo Todo mundo sabe. Não tem modo melhor de tirar a graça de uma piada que explicar a piada. Alguns poemas são como piadas. Um achado, uma engenhosa combinação de peças a elementos, um mecanismo que produz graça e significado. Todo mundo sabe, mas tem gente que gosta. Se você não gosta, ótimo, conte comigo e vamos juntos virar pra próxima página da revista. Mas se você gosta, está certo, vamos fazer essa caridade. Mas não se irrite se eu não parecer tão científico ou solene quanto você talvez gostaria. Tem gente que não gosta. Tradução tem dois tipos, a literal e a outra. Todo mundo sabe. No caso desse loneliness, a literal seria a que é rigorosamente fiel não só ao sentido das palavras, mas também à configuração gráfica do texto. Quer dizer, repetir o mesmo número de letras por verso, o mesmo número de versos e estrofes. Por duas razões. Primeiro, a configuração visual do poema, a extensão dos versos variando um pouco, imita os movimentos de uma folha caindo (a leaf falls), até pousar no chão, no último verso, o mais longo. Segundo, porque os cortes nos versos me parecem deliberados para ressaltar elementos associados à noção de solidão (o numeral one, o artigo singular a, a letra 1 idêntica ao algarismo um). Isso tudo, todo mundo sabe. Então eu cheguei a resolvi que, em português, nenhuma folha is cair, mas um sol is sumir. Razões, razões, pra tudo há razões, no final. Eu também tenho as minhas, e se elas não valem muito, não me importo. Não são para vender. Primeiro, obviamente, o pôr do sol é uma imagem que corresponde a uma representação universal da melancolia, o final de alguma coisa, a morte talvez. Assim como a folha que cai, o outono a tudo isso. As duas são igualmente lugares comuns universais. Além disso, são também equivalentes na idéia de um movimento descendente, que o plano visual do poema sugere. Segundo, olhe bem o rendimento das peças da curta frase: um (artigo indefinido singular, lembra unidade, isolamento), sol (desmembrado em so e l, ou seja, só e o algarismo 1), some (decomposto em so, de novo só, e me, pronome de 14 pessoa do singular, reforçando a idéia de concentração no eu, e a idéia de solidão). Mmm. Isso tá cheirando a tapeação, não é? Você não viu nada. Também a palavra solidão repete nas primeiras três letras a palavra sol, e termina num redondo e fraudulento o, imagem a ícone do próprio sol, que pode, assim, perfeitamente ficar sozinho no último verso, coitado, igual ao próprio sol, quase se pondo no horizonte. Sumindo. Feito eu. Adeus. trad. Rubens Figueiredo in revista 34Letras nº 5/6, 1989, p. 318 - 321. | ||
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