PENSAGEM Árvore entre raios: arvora-se um ruído. Tudo claro, lindo, ido. A língua, mente, sente seu gosto: tudo o que toca é verdade. O discurso da tarde e seu susto se cola ao sentido, seu duplo aqui onde repousa e se excita, visiva, sua clareza intensiva. ° ° ° Coisas vistas uma só vez, nítidas, brisa ao revés. Partículas de tempos, possibilidades de luz.
STANZAS IN MEDITATION para Henry David Thoreau Folhas negras caem, rufam em profusão. O vento encrespa a Água, Tempo, enruga faces. Um vale revela canyons, grutas: em silêncio, exploramos o interior Destas montanhas. Uma uma chuva fina, estranha, começa a cair e súbito dissipa o ruído áspero de uma vespa. Este é o céu, claro, como metal. E aquilo, A fumaça abandonada por um trem, talvez. Flores Se dissolvem nos olhos, e nos debruçamos sobre velhas lendas Conferindo as pegadas de um animal desconhecido. A trilha termina num riacho. A água se surpreende com este vento todo que vem do Oeste e que agita a sinfonia das árvores. Neblina nítida, colinas, um vapor neste espelho. Num ponto qualquer da paisagem captamos seus olhos verdes, mudos, fixos na relva úmida. Um animal e você contemplam do mirante este milagre (a baía vazia a areia do dia exibindo sua rasante rochedos & distâncias, como antes, animada pelas danças do vento fazendo desta ausência presenças manifestas em tudo: chuva que desaba entre os olhos abertos da serpente. Um flash de luz entre os bambus) : o silêncio do sonho traduzindo uma imagem-movimento que se desfaz entre a verdade dos instantes.
CANÇÃO DAS MUSAS a noite arrasta seus cascos abrindo clareiras no acaso que precede o som. até as estrelas, atrás, estão mais acesas se por tristezas a morte que acusas não couber em belezas linha por linha arrastem-nos como a um cão de espumas levem-nos a parte alguma.
DURAME No cerne, a carne, o ser. O instante, que ia ser isto, Não foi, ficou, de repente, no mistério de um sorriso.
A TEMPESTADE Canibal, palavra latina, à maneira de canis, animal de fidelidade canina. Nas Bermudas, sublime ironia, será um vento do cão e vai se chamar hurracán. E quando o mar de lã de repente apontar terra à vista Então será Caliban.
SOBRE UM DITADO ANTIGO Vou dizer de novo o que disseram Para que a mente nunca esqueça Que um dia, folhas, nossos lábios se fizeram Relva, céu veloz, veludo e névoa espessa. Essa fumaça no vazio é parecida com a outra que, vida, dura como dura o raio, quartzo que uma pupila dilata e irradia. Quem diria, por exemplo, que sob a carne do incenso, no durame da tarde, o sândalo respira sem fazer nenhum escândalo.
FUGAZ passagem por uma paisagem, lugar do onde, do ontem, do quando, quantas palavras ficaram faltando na boca cheia de imagens. o outro é aquele que ficou à margem, no espanto de um pronome, no corpo de uma brisa suave; o outro é como uma fome pluma à deriva, à distância, ou quase. estranho em sua própria viagem, garrafa com uma mensagem, olhar durando numa flor, sem nome, secreta, selvagem. Desterro, água bebida num trem, peça incompleta, festa adiada, vertigem, a cabeça sempre em alguém, eu outro, eu todos, ninguém.
Os poemas são do livro VISIBILIA (Sette Letras, 1997).
Leia uma entrevista com o poeta em Balacobaco
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