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Mário Raul de Morais Andrade (São Paulo SP 1893-1945)

O maior nome do modernismo, refém de seu propalado iconoclasmo, teve de explicitar, no "Prefácio interessantíssimo" de PAULICÉIA DESVAIRADA, que descartava o soneto por opção (e não por inépcia, como — ele provavelmente previa — viria a ocorrer entre os que hoje repudiam o gênero). Ou seja: desdenhava, mas queria provar seu domínio do molde exemplificando com aquele intitulado "Artista". Anos depois, cedeu à tentação bissexta para homenagear um jovem a cujos encantos não resistira. Quanto a mim, também não resisti à fantasia de comparar o pé de Mário ao de Oswald de Andrade, aproveitando, de quebra, a frase iniciada por pronome e a grafia de "milhor" ao gosto do Mestre.


SONETO 38 MODERNISTA

Quem foi mais importante, Oswaldo ou Mário?
Me consta que o "Prefácio" milhor fez,
em termos de chocar o bom burguês,
que todo o antropofágico mensário.

Mas, pra não cometer erro primário,
justiça seja feita a todos três,
os dois Andrades mais o Português,
pois, sem Camões, cadê réu literário?

Questão particular me ocorre agora:
Qual tinha maior pé, Mário, o mulato,
ou quem foi queridinho da Isadora?

O Oswaldo pode até ter sido um gato,
mas meu faro bizarro corrobora:
O Mário tinha pé mais largo e chato.

Glauco Mattoso Eis o soneto comprobatório da habilidade do poeta e outros raros casos em que o caso pediu prova de amor: ARTISTA O meu desejo é ser pintor — Lionardo, cujo ideal em piedades se acrisola; fazendo abrir-se ao mundo a ampla corola do sonho ilustre que em meu peito guardo... Meu anseio é, trazendo ao fundo pardo da vida, a cor da veneziana escola, dar tons de rosa e de ouro, por esmola, a quanto houver de penedia ou cardo. Quando encontrar o manancial das tintas e os pincéis exaltados com que pintas, Veronese! teus quadros e teus frisos, irei morar onde as Desgraças moram; e viverei de colorir sorrisos nos lábios dos que imprecam ou que choram! QUARENTA ANOS A vida é para mim, está se vendo, Uma felicidade sem repouso; Eu nem sei mais si gozo, pois que o gozo Só pode ser medido em se sofrendo. Bem sei que tudo é engano, mas sabendo Disso, persisto em me enganar... Eu ouso Dizer que a vida foi o bem precioso Que eu adorei. Foi meu pecado... Horrendo Seria, agora que a velhice avança, Que me sinto completo e além da sorte, Me agarrar a esta vida fementida. Vou fazer do meu fim minha esperança, Ôh sono, vem!... Que eu quero amar a morte Com o mesmo engano com que amei a vida. SONETO AZUL Aceitarás o amor como eu o encaro?... ..Azul bem leve, um nimbo, suavemente Guarda-te a imagem, como um anteparo Contra estes móveis de banal presente. Tudo o que há de milhor e de mais raro Vive em teu corpo nu de adolescente, A perna assim jogada e o braço, o claro Olhar preso no meu, perdidamente. Não exijas mais nada. Não desejo Também mais nada, só te olhar, enquanto A realidade é simples, e isto apenas. Que grandeza... A evasão total do pejo Que nasce das imperfeições. O encanto Que nasce das adorações serenas.

Û Ý ´ ¥ Ü * e-mail: elson fróes