|| | ||S|| | ||O|| | ||N|| | ||E|| | ||T|| | ||Á|| | ||R|| | ||I|| | ||O|| | ||||| | ||||| | ||||| | || |
Ruy Alberto d'Assis Espinheira Filho (Salvador BA 1942)
Um dos responsáveis pela sobrevivência do soneto após a dessacralização
modernista e a ressacralização de 45, sua produção é escassa mas
liricamente densa. Garimpados de seus livros, os exemplos abaixo compõem
uma antologia panorâmica:
PRIMEIRO SONETO DA PERMANÊNCIA Esta saudade bate no meu peito como um vento encrespado de remorsos, tardes mansas, manhãs iluminadas, meigos seios nascentes, bicicletas em torno do jardim. Esta saudade queima e me embriaga. E bebo mais. E bebo tudo e já não resta nada no universo a não ser a embriaguez desta saudade. E eis que me sinto absinto e não me encontro em mim. Estarei morto? Não estou morto: estou é lá, aqui na distância, no centro deste parque que gira e gira o mundo. Aí estou e fico imóvel neste carrossel. SONETO DO CORPO Corpo de sol e mar, não me pertences. Não me pertences e, no entanto, em mim ondeias e marulhas num sem fim de amavio. E cintilas, e me vences, e me submetes eu, o siderado a teus pés. Eu, o pobre. Eu, o esquecido. Eu, o último. O morto e o renascido! Tudo por teu poder, ó iluminado corpo de brisa e pólen, ventania e pedra! Harmônico e contraditório e presente e alheio, flama e pena. Feito de vida, enfim: desta alegria. Em si. Porém, em mim, campo ilusório em que a memória pasce e me envenena. SEGUNDO SONETO DA PERMANÊNCIA Só eu te vejo andar por esta rua, à sombra de árvores já abolidas, ao som dos idos canários, ao perfume de jardins que há muito se exalaram. Só em meus olhos é manhã marinha o teu olhar (os outros vêem a tarde, talvez a noite, iludidos pelas cinzas dos dias que em ti pousaram). Cinzas. Mas não aqui, não nesta rua (no alto-falante, rosa e violino...) por onde sempre passas e clareias meu peito ah, todo branco, iluminado de ti, amplo de nuvens, luas cheias, como se fosse o peito de um menino! SONETO DO AMOR E SEUS SÓIS Eram teus olhos de água, olhos de água ensombrada de folhas, eram teus olhos de água marinha, eram teus olhos de água límpida, ou turva, eram teus olhos de água cintilante de tão negra, eram teus olhos de água luminosa como só umas raras dessas brisas chamadas alma, eram os teus olhos e eis que teus olhos ainda são, que sempre outros olhos e os mesmos: o amor diverso e idêntico no azul do peito a amanhecer-me, a moldar-me as asas de mergulhar no chão profundo e patas de galgar os altos ventos. SONETO DA PAIXÃO Todos os meus caminhos se derramam nas fragas deste amor e me confinam nesta ternura fera encovilada em onde era um pulsar de apenas vida e agora é furacão sobre palmeiras, não de quando sabiava a minha infância porém de um outro lindo, uma vertigem voluntária do sol e da loucura. Oh este amor, todas as graças, todos os látegos, o corpo não suporta tanto, mas fujo à queixa e sou imenso e sou muito e bonito nesta chama. Tenho pena das pedras, das areias e do esplendor de Deus na Sua glória. SONETO PARA ÂNGELO ROBERTO E FRED SOUZA CASTRO Estou doente demais para escrever seja o que for na tarde que se esvai. Na alma, uns amavios de morrer vêm tingir-me com a noite que não cai ainda mas cairá daqui a pouco, inelutável, a arrastar na rua, ao frio e ao riso do seu vento rouco, o fogo-fátuo que desprende a lua, velho cadáver sem repouso. Agora o que quero é sumir e aparecer só num canto distante e sossegado onde enfim possa ser feliz e embora contrariando Pitágoras fazer criação de andorinhas no telhado. SONETO DE UMA MORTE Ele olhava o espelho que chorava, e o que havia em si só era ausência: estava morto era o por quem chorava o espelho com seu rosto, pura ardência de ausência, ausência, ausência que chorava o espelho assombrado pela morte (o vento do jardim ainda soprava as palavras que ouvira: a sua morte). Um outubro evolado há quinze anos viu essa morte, o pranto em duplo rosto. Que no morto ainda está, íntimo rosto da imarcescível morte, imune aos anos. Que passará só quando ele passar. O que é o mesmo que jamais passar. SONETO DO FANTASMA A história está contada. Resta apenas a memória demente de um fantasma que em si carrega a rua, a lua, a casa, gestos, odores, ruínas de poemas. Quem passar por ali, ali não passa, que tudo é só passado. Só há enganos. Há sons no ar, mas tudo falso canto. Naquela porta, porta já não há. Tudo é nele. Só nele ainda se conta essa história, essa lenda, esse delírio. Que é onde ele também se conta e vai, vendo o que ninguém vê, ninguém encontra. Lunado desse amor, doido da vida que em seu vulto resplende e nunca mais. SONETO DO ANJO DE MAIO Então, em maio, um Anjo incendiou-me. Em seu olhar azul havia um dia claro como os da infância. E a alegria entrou em mim e sem sua luz tomou-me o coração. Depois, suave, guiou-me para mim mesmo, para o que morria, em meu peito, de olvido. E a noite, fria, fez-se cálida e a mágoa desertou-me. Já não eram as cinzas sobre o Nada, mas rios, e ventos, e árvores, e flamas, e montes, e horizontes sem ter fim! Era a vida de volta, resgatada, e nova, e para sempre, pelas chamas desse Anjo de maio que arde em mim! SONETO DE JULHO É muito tarde para não te amar. Tudo o que ouço é o sopro do teu nome. O que sinto é teu corpo, que consome presente, ausente o meu corpo. Luar em que me abraso, morro: teu olhar ofuscando memórias, onde some um mundo, e outro se ergue. Sede, fome e esperança. Ah, para não te amar é tão tarde que tudo é já distância, que só respiro este luar que me arde, este sopro sem praias do teu nome, esta pedra em que pulsa e medra a ânsia e esta aura, enfim, em que me envolve (é tarde!) o que és presente, ausente e me consome. SONETO DO QUINTAL (para Matilde e Mario) Ao recordar a moça, eu me comparo ao cão que vejo a interrogar a brisa. O que é mal comparar: bem mais precisa é a mensagem de odores que o faro decifra. E então medito sobre o claro ser desse cão, e invejo essa precisa vocação de existir. E ausculto a brisa e nada nela encontro. Nada. E paro de lembrar e pensar. Há mais profícuas ocupações. Exemplo: só olhando estar. Cão. Nuvens. Ramos. E, dormindo, um gato. E essas formigas três conspícuas, vestidas a rigor, deliberando em torno de uma flor de tamarindo. SONETO DA JUSTIFICAÇÃO (a Mário Vieira) Esta noite (ele pensa) justifica com seu luar abençoando os ramos do pé de carambola os estertores de que surgiu o Universo. Fica tudo, tudo (ele pensa) redimido. Deuses. Deus. O Acaso. Não importa. Valeu (eis o milagre em sua porta!) a pena que custou a gestação deste momento. O qual lhe justifica (ele suspira), enfim, a paciência de até chegar a este luar nos ramos ter (calcula) esperado cinco décadas, sessenta dias e, fechando as contas, alguns punhados de bilhões de anos. O POETA EM SUA VARANDA (a Paulo Henriques Britto) Se ajeita na cadeira reclinável, entre uma saudade e uma quimera, sob outono que sabe a primavera e agora o afaga com a mais amorável tarde do mês. Aliás, todo ele amável, este abril, ele pensa, já a quimera enviando a pastar em outra era, que à hora basta esta admirável lembrança que o embala. E eis que seu ser é como cristalina clarabóia banhada pelo sol do amanhecer, enquanto, a essa luz de ouro e jóia, serenamente ele começa a ler uma carta de amor vinda de Tróia. SONETO DA TRISTE FERA (a Florisvaldo Mattos) Quanto mais o olhar acera, recrudesce a noite vasta, restando apenas à fera as trevas em que se engasta. Choramos, era após era, esta carência que pasta entre escombros de quimera tudo aquilo que não basta a nós, esta triste fera que vê só o duro luzir desta, mais fera que a fera, condição que a vergasta: corpo o que nos vai trair; e alma o que nos devasta! BLIND BORGES A vasta e vaga morte, esse outro sonho, não é só outro sonho: é a mais remota ilha de ouro a que nossa derrota nos leva, inexorável, sonho a sonho. Latidos pelos cães, sonho após sonho, sonhamos. Esta é a vida, a vela, a rota do homem: sonhar. E em áurea praia ignota sonha o que sonha o sonhador, que é sonho. Isto é o que pulsa em nós: o ansiado ouro distante e aqui, no coração , tesouro cuja procura tece a nossa sorte; rumo que a alma singra e sagra em ouro até chegar enfim a esse tesouro incorruptível que nos sonha a morte. SONETO DA TARDE O que sei é o que sinto em mim: cansaços, nesta tarde. Afinal, cinqüenta e um anos são uma era. E que outros mais anos ainda restam, e que mais cansaços? Cansaço de falar destes cansaços... Mas, que fazer? Esse cultivo de anos (uns frutos sempre desiguais, os anos) só gera uma colheita de cansaços. E é assim. E a tarde vai passando sobre os muros e em mim, que envelheço enquanto, entre cansaços, vou pensando (e isto é tudo, em suma, reconheço) que o que sei é que nada está voltando e faz tempo demais que não te esqueço. SONETO DO INELUTÁVEL (a João Carlos Teixeira Gomes) Primeiro foi, senhora e dona, esta. Todo o horizonte do amor cercado. Isto até o momento em que, pasmado, viu ele aquela adentrando a festa. Mas então, afinal, não era esta a verdade do amor! Iluminado, lançou-se em samba, valsa, tango, fado ele aos meneios dessa nova festa! Rodopiou, feliz, junto daquela, até sentir o aroma dessa outra que por ele passou, roçou, tão bela como nenhuma. Menos aqueloutra, que só não é mais amorosa e bela do que a que é, e há de ser sempre, a outra. MARIO, EM SEU BOTE INFLÁVEL, NO MAR DE GUARAJUBA O dia acende o mar para o menino e seus sonhos num barco feito de ar. Tróias para onde ir, onde lutar, falam na brisa, nas ondas. Destino é o que nos damos. Como esse menino rema o barco no rumo de outro mar (muito antes do tempo de chorar as ítacas). Não sonha, o destino, o que somos, seremos. Nossos sonhos é que o sonham. Como os que um menino num barco vai sonhando: claros sonhos de distâncias que sonham um destino formoso como sabem ser os sonhos. Ou os deuses. Ou o mar. Ou um menino. SOSÍGENES COSTA (a Hélio Pólvora) Teu rosto de cerusa no retrato nada me diz do sol na ravenala, muito menos de aroma, vinho, gala: é só um moço ali, de fino trato, que, constrangido, posa. Mas (sou grato a Mnemósine), se te ouço a fala dos versos, se abrem fogos de Bengala trazendo-me, de ti, outro retrato. Mas não um rosto: a Cor como uma fonte jorrando anjos, pavões, a cerofala do luar, dragões, poentes de Belmonte. Maga poesia que tua alma exala e que só há de deixar-me a voz e a fronte quando eu morrer perdendo o mundo e a opala. SONETO DE INCOMPARÁVEIS JOELHOS Nada a que comparar: eram joelhos numa manhã de sol, há trinta anos (pensando bem, quase quarenta...), joelhos claros, suaves, postos em sossego. E eis que eram dois, serenamente (não qual lago de soneto). Dois joelhos, não mais, observei do modo oblíquo. À sorrelfa, talvez, como um labrego sub-reptício. Dois joelhos como (Seios? Melhor não acolher o símile que súbito se oferta, muito embora sempre caras me sejam essas colinas.) só eles, densos, unânimes, solares, ardendo sem lugar, sem tempo em mim. SONETO PARA SANDRA Porque és assim tão bela, só me resta achar que os deuses me amam; e urdir-me eu-mesmo, como nunca, sem mentir-me, amplo, repleto, pleno, claro, nesta lua que em mim acordas para esta gesta que tange a alma e me faz ir-me de mim a mim, em mim, para sentir-me como tu me modulas nesta festa que retumba na aorta iluminada. Porque és assim, uns ventos doidos tramam meus caminhos, que esplendem na orvalhada da vida nova, de onde os sonhos chamam, e eu beijo a tua boca ensolarada e só me resta achar que os deuses me amam. SEGUNDO SONETO PARA SANDRA Porque és, além de bela, fugidia, e me deslembras de alma tão serena quanto os teus olhos, só me resta a pena de assim te aceitar. Como a poesia, me assombras sem aviso: pleno dia; depois, a noite, a ausência, o vácuo, a pena de te saber distante e tão serena em me esquecer. Mas há uma alegria que em mim dispersa a infelicidade cujo sabor amarga estes quartetos que acabo de escrever e, na verdade, já me compõe feliz nestes tercetos: porque ganhei, contigo, uma saudade luminosa como és e dois sonetos. FLOR DE JUNHO Tua lembrança nasce em mim, digamos, como uma flor de junho: úmida, fria, curvada ao vento e à melancolia do que vivemos. Mais: do que deixamos de viver (penso nisto, assim, digamos, mordido de remorsos). Quem diria que viria tão rápido este dia em que eu veria que passei, passamos? Flor de junho... Essa história, outras histórias, por quanto ainda, assim, dessas memórias suportarei? E o corvo Nunca Mais me pousa no ombro. E, vendo a comoção lavrando-me, me afaga e me diz: "Não há de ser nada amanhã tem mais." SONETO DA RESSACA Não foi por ter bebido que fiquei pensando estes românticos pensares que são velhos suspiros, de outros ares, que muito antigamente suspirei. E que ainda suspiro, pois não sei como silenciar esses cantares de sereias que vêm, claros, dos mares onde cheguei à glória e me afoguei vezes sem conta. Doce naufragado que, bêbado de luar e malmequeres, retorna, sempre. E, mesmo ressaqueado, com seu verbo amoroso e outros talheres já se antevê sair, resignado, para mais desconcertos com mulheres. SONETO DA NEGRA (a Maria da Paixão) A cor da suavidade é que a modula. Nela se abisma a luz e se revela incapaz de alterar nada daquela penumbra que a atrai, absorve, anula. Nessa paisagem que coleia, ondula como um rio, ou o mar (e é dela e ela), um vento violento me desvela um animal que me trucida e ulula. O tom da suavidade não se altera, eleva um canto cálido e me diz que são garras de amor, e é bela a fera. E assim, em carne rubra e cicatriz, entrego à cor profunda que me espera estes despojos em que sou feliz. SONETO PARA SAFIRA DISPARUE Tinhas nome de pedra preciosa. Seios adolescentes. A cintura meiga. E um sopro de alegria pura na boca em riso, em céu, em sol, em rosa. Joelhos impávidos. A bunda airosa. Coxas ufanas. Aura de ternura por todo o corpo teu de criatura não apenas no nome preciosa. E desapareceste, então! Que história foste viver, feliz ou dolorosa? Não sei. Mas sei que em mim és plena glória ainda em riso, em céu, em sol, em rosa, sempre antes da partida , na memória intacta e, mais que nunca, preciosa. ANTONIO BRASILEIRO Rumina um sonho: gado sonolento entre as ondas que o vento faz no pasto, que é vasto como o gesto desse vento amplo como o horizonte vasto, vasto. Há deuses nas colinas desse vento e nas fontes profundas desse pasto que são, assim, mais verdes e mais vastos que quaisquer pastos, horizontes, ventos. Rumina um sonho e sonhos nesse sonho, que sonham outros mais. Na tarde amena, tudo é sonho de deuses e rebanhos. E ele se deixa navegar, sereno, nos vastos pastos ventos horizontes e, denso, de alma toda, escreve um poema. GESTOS: DOIS SONETOS I Acaricio teu rosto na lembrança com minha mão de antes, suave e pura, anterior a esta mão impura que, hesitante, aqui escreve. Avança esse gesto perfeito (pois lembrança) além da testa nítida, e a escura maré dos teus cabelos toca pura carícia na carícia. E nada trança mais a memória. E ainda que aventura poderia contar? Em sua dança, o gesto é a história toda: a ventura do afago de alma que no tempo avança e me devolve a límpida ternura anterior aos gestos de lembrança. II Acaricio teu rosto na lembrança com minha mão de antes, suave, pura, anterior a esta mão impura que, hesitante, aqui escreve. Avança esse gesto perfeito (pois lembrança) além da testa nítida, e a escura maré dos teus cabelos toca pura carícia na carícia. E nada trança mais a memória. O conto de ternura já inteiro se contou. Em sua dança, o gesto é a história toda: a aventura do antigo afago que no tempo avança e em mim desperta a límpida ventura da carícia de um gesto de lembrança. SONETO DA LUZ DE MAIO (a Alessandra Leila) Neste maio que finda, o sol é grande como em Sá de Miranda. Do alto dia desce a luz como um riso, uma alegria e vem ecoar nas pedras da varanda. E até em mim ecoa essa alegria! Mesmo em mim, que já a última esperança de cor e luz deixara ir-se na dança das chuvas, dos trovões, da ventania. Vem ecoar em mim e me conduz para a vida, de novo, e para a calma que desce dela mesma, dessa luz que pousa sobre tudo e tudo acalma neste maio que finda e que reluz nas pedras da varanda e em minha alma. SONETO DA CHUVA E DA VOZ (a Miguel Sanches Neto) Desde que despertei está chovendo. Aliás, desde antes, pois, ainda dormindo, claramente escutei chuva caindo longe, por trás de um sonho: meu pai lendo, para mim, "Hora Absurda"; ainda estou vendo seu rosto em luz antiga. Quase findo é o dia, agora, e a chuva caindo, caindo... E em minha alma meu pai ainda está lendo. Não é, como no poema, um ouro baço que chove aqui: é só água do outono que o calendário traz nos fins de março. E a voz prossegue. E, num sonho sem sono, me consola de mim neste cansaço de outonos falsos, sombras, abandono. SONETO DE UM AMOR Quando chegou, nem parecia ser. Agora é isto, este pulsar violento a rir à toa, a crepitar no vento, e este oceano, e este amanhecer, mais estas comoções de anoitecer, mais estes girassóis no pensamento, raio fendendo a alma (lento, lento...), e esta estranheza de dizer e crer, e este ácido pássaro no peito, e uma ternura ardendo na ferida, e um silêncio, e um fragor, e o céu desfeito por sobre tudo, e a lua comovida chorando um choro cândido, perfeito a esta tortura do esplendor da vida! SONETO A DEZ DIAS DE COMPLETAR 60 ANOS Esta saudade: a manhã que aporta como um filhote de dragão marinho cujo olhar me compõe em terso vinho. E logo outra saudade: quando à morta tarde eis que o vinho é árduo. E então aporta a noite, velas tintas de outro vinho em que se esgarça a luz do azul-marinho como que num sabor de lua morta. E assim é: lago obscuro, um vago vinho em que marulha a voz de outras idades a recontar os contos do caminho até este dia: suores, vanidades tudo valeu. Um vinho que chora os vinhos idos em que se embriaga: estas saudades.
Û Ý ´ ¥ Ü | * e-mail: elson fróes |