|| ||S|| ||O|| ||N|| ||E|| ||T|| ||Á|| ||R|| ||I|| ||O|| ||||| ||||| ||||| ||

Stella Leonardos da Silva Lima Cabassa (Rio de Janeiro RJ 1923)

Ao contrário de José Albano, Guilherme de Almeida ou Abgar Renault, que revisitaram Camões em forma e fundo (e a fundo), ela quis ser mais eclética e versátil: amaneirou também Mário de Andrade, Jorge de Lima e outros. Sempre, porém, com estudada perícia, a mesma empregada ao sonetar de si mesma, como na amostra abaixo:


AMARGURA

Por teres sido um dia o meu maior amigo,
Um dia me julgaste a tua amiga, apenas...
Não sabias então do sentimento antigo
Que eu, altiva, ocultava, e contaste-me as penas...

Como foi que te ouvi com feições tão serenas?!...
É coisa que até hoje entender não consigo:
Tu que falavas mal dessas fingidas cenas
A que o Destino obriga, e eu que fingi contigo!

Se imaginas, porém, que fiquei compungida
Quando te vi descrente, amaldiçoando a Vida,
Tendo eu tantas razões de me queixar do fel...

Jamais meu coração soube guardar rancores:
Se a Vida é uma comédia e é certo haver atores,
Não na posso culpar por meu triste papel!...


DONZELA DAS ROSAS

Eu sei de rosas silvestres
que alguém colhe meu suspiro
e as faces minhas se rosam
se alguém surge em meu retiro.

E sei da rosa singela,
flor poesia onde me inspiro,
que o que me toca é uma rosa,
tocante rosa a que me miro.

Eu sei de rosas silvestres
que desabrocho em suspiro,
que minhas rosas desmaiam,

que num de espinhos me firo
se quem faz brotar as rosas
não traz rosa a meu retiro.


De Camões, Stella glosou, por exemplo, os seguintes versos:

.."Mas cá onde mais se alarga, ali tereis
Parte também, co pau vermelho nota;
De Santa Cruz o nome lhe poreis;
Descobri-la-á a primeira vossa frota." [Camões, LUSÍADAS, canto X]


NAVEGAR É PRECISO (para Gilberto Mendonça Teles)

Revejo "a grande terra que contina
vai de Calisto ao seu contrário polo."
Na meta de meus antes ilumina
mais que o metal da "cor do louro Apolo".

Reluz o verde meu — almada mina —
e um ver de novo sol me alumbra o solo.
Na voz que inovo há nau de alma cristina
e novas ondas e ondes onde rolo.

Renasço e morro da saudade aquela
que crucifica lusos mas que é luz.
Me alço no alvor da viagem de alta vela

timbrada pelo rubro de árdua cruz.
Adeus, avós! Entregue a caravela
a Deus, de novo ruma a Santa Cruz.


De Mário, Stella glosou, por exemplo, os seguintes versos:

..e só vi no perfil da cidade,
o arcanjo forte do arranha-céu cor-de-rosa
mexendo asas azuis dentro da tarde. [Mário de Andrade]


SONETO DE AR AMIGO

Vens vindo pelo poema de ar amigo
não mais de Paulicéia desvairada.
Vens vindo, Mário. Na tua cidade.
São Paulo comoção de toda vida.

Vens vindo. De olhos novos mas tão novos
que o de tarde é visão abrindo os olhos
num abril que nos vem mário-de-andrade.
Num todo novo e um novo mais humano.

Bem mais humano que um arranha-céu
no dia-a-dia sobre o terra-a-terra.
Algo de anjo arranhando céu palpável.

Bem São Paulo perfil força de arcanjo
na rosa cor do corpo e o corpo de alma
mexendo asas azuis dentro da tarde.


De Jorge de Lima, Stella glosou, por exemplo, os seguintes versos:

Feliz de quem em cânticos se esconde
E julga tê-los em seu próprio bico
E ao bico alheio em cânticos responde. [Jorge de Lima]


SONETO ALADO

À tua mão que ia se alando, alando
como asa que não mais te pertencia,
ao sofrido poder de tua mão,
alta noite almo poema te escrevia.

E os pássaros sonhados de teus ramos
cruzaram pelo céu de um novidia
— nova cruz de revoada franciscana
na loucura de Deus alta poesia.

De teu segredo, um pássaro de cântico
aos pássaros alheios respondia,
que bem-amaste os pássaros, irmão,

e por todos os cantos pena havia.
E nas penas penadas foi teu canto
conformado das penas que escondia.

Û Ý ´ ¥ Ü * e-mail: elson fróes