|| ||S|| ||O|| ||N|| ||E|| ||T|| ||Á|| ||R|| ||I|| ||O|| ||||| ||||| ||||| ||

RIOS, SAMANTHA (pseudônimo)

Por trás do pseudônimo evocativo de outra autora despudorada (Cassandra Rios) esconde-se um nome do sexo masculino (Ésio Antônio Pezzato), cujo livro HISTÓRIA DE UM AMOR enfeixa uma centena e meia de sonetos eróticos que caracterizam uma das mais pitorescas personagens poéticas do gênero na atualidade.


[002]

Ele me disse: " — chega, vou-me embora,
Mulheres como tu acho às dezenas...
Não é preciso, não, armares cenas,
Pois bem sei que é chegada a minha hora.

"Espera-me vestir, não há demora,
Não quero ouvir de ti frases obscenas,
Eu já vou indo, adeus... espero apenas
Que não me mostres teu olhar que chora...

"Eu não agüento mais ver-te ao meu lado,
Esqueça que já fui o teu amado
E que o meu coração te pertenceu..."

— Assim falou, depois bateu a porta...
Desde este dia tenho a vida morta
E sem ele nem sei quem já sou eu...


[010]

Agora, no silêncio de meu quarto,
Sozinha, reclinada em minha cama,
Eu sinto que ninguém no mundo me ama
E que minha alegria teve parto...

De dissabores meu viver é farto...
Um triste pranto meu olhar derrama:
Sozinha estou, ninguém, ninguém me chama
E vivo no silêncio de meu quarto.

Pois ontem mesmo, com prazer infindo,
No mesmo cálice bebemos rindo
O champagne que fez nos libertar.

Hoje, no chão, o cálice vazio...
Sozinha em minha cama sinto frio,
Sem um amor que possa me esquentar...


[011]

É só pegar o fio da meada
Que as lembranças, aos poucos, vão surgindo:
— Um passeio no mar num dia lindo,
Ou perambulações na madrugada...

Um quarto de motel e, apaixonada,
Eu me entregando a ti feliz, sorrindo,
Em teus braços gemendo um gozo infindo
Ou em teu corpo másculo, abraçada...

Depois em nosso corpo a ducha fria,
Nós dois guerreiros num banhar de espuma
E novamente a posse, a possessão...

Desejo à flor da pele, a fantasia,
Nós dois juntinhos sem vergonha alguma
De vivermos à fúria da paixão!


[012]

Na hora da posse minha febre é tanta,
Que quando estás dentro de mim, querido,
Todo o meu corpo fica incandescido
E em êxtase de amor, minh'alma canta.

Teu corpo quente, serve-me de manta
E teu calor me passa tanto fluído
Que louca fico a ouvir em meu ouvido
Tua voz sussurrar: " — te amo, Samantha!..."

Eu não me lembro, amor, então de nada...
No peito pulsa pleno o coração
E minha mente fica alucinada.

— Enche de vida, amor, minhas entranhas,
Com teus beijos sufoca minhas manhas,
Com teu prazer sufoca-me a emoção!


[015]

Quando a ti me entreguei a vez primeira
E me senti Mulher real e amada,
Extasiada então não disse nada,
Mas fiquei sendo tua prisioneira.

Quando tentei falar — voz embargada,
Senti meu corpo todo em tremedeira.
Pensava antes ser uma geladeira,
Mas tinha uma fogueira em mim calcada.

E quando teu comboio audaz, pulsante,
Penetrou de meu corpo, nas cavernas,
E seu interior encheu de vida,

Tive a certeza do que é ser amante,
Flutuei no céu em sensações eternas,
Fui ao céu numa estrela colorida.


[032]

Tudo, tudo lhe dei e ele exigia
Que eu mais lhe desse e como não bastasse
Uma noite atirou na minha face
Que eu era rude e má, soberba e fria.

Pediu meu corpo — dei com alegria.
Catequizou-me para que eu o amasse.
Amei com toda a força que podia
E agora vem pedir-me o desenlace...

O que mais quer de mim? meu pensamento?
Ele já é todo seu (e é meu tormento!)
Desde que o conheci não tenho calma.

Toma a minha razão (se é que ainda a tenho)
Se ardente foi e agora fria venho,
É que com ele até deixei minh'alma!


[034]

Já não agüento mais... tua presença
Eu exijo de forma obrigatória.
Como ré dou a mão à palmatória:
— Tu és minha única e mais cara crença.

Sofre meu coração esta doença:
Não consigo apagar-te da memória.
Tu és igual à nota promissória
Que precisa ser paga antes que vença.

Todas as noites, em angústia, acordo...
Estou em alto mar, estou a bordo
De um imenso navio... e entre mil ais

Vou à amurada e em desespero grito,
Sentindo estar à beira do Infinito,
Vendo o teu vulto me acenar do cais...


[042]

Amamos na penumbra de uma sala,
À luz de um abat-jour, sobre almofadas,
Juntos varamos longas madrugadas
Fazendo deste amor uma só fala.

Quando tu me dizias: " — quero amá-la"
Vinhas como as panteras esfaimadas,
E meu corpo cobrias com dentadas
Como se eu fosse uma sensual vassala.

O nosso mundo era único e discreto,
Juntos vivemos sob um mesmo teto,
Juntos vivemos nosso amor tão louco...

Se hoje enfim, está tudo terminado,
Sinto que mais devia ter te amado,
Pois tudo o que te amei, foi muito pouco.


[047]

Inútil foi a espera... ele não veio...
Preparei-me de forma provocante
Para lhe ser a mais ardente amante,
Mas... inútil a espera e meu anseio...

Meu cheiro não serviu-lhe de correio:
Nem a palpitação do peito arfante
Fez que ele me encontrasse e delirante
Beijasse meu pescoço, a boca, o seio...

Nos lençóis de cetim avermelhado
— Cor de Paixão! — amarfanhei-me toda
E perdida fiquei num devaneio.

Mas vazio na cama era o seu lado —
Planejei tão ardente nossa boda
Mas... inútil a espera... ele não veio...


[053]

"Samantha, eu tanto e tanto te desejo,
Que penso em ti — minh'alma alegre, canta.
Meus lábios só desejam o teu beijo
Que me dá vida, afeto e me acalanta.

"Em outras faces tuas faces vejo,
O teu corpo me serve como manta...
Teu nome é uma canção que canto e almejo,
O amor devia é se chamar — Samantha!..."

Assim dizias rindo em meu ouvido,
Pois este era teu canto preferido
E me embalavas com ternura e calma.

Mas desde que partiste, estou sozinha...
No canto a tua voz não me acarinha,
E em desesperos sinto então minh'alma.


[065]

Minhas amigas dizem: " — é loucura
Este caso de amor... tu bem mereces
Algo melhor. Torturas e padeces
E masoquista, gostas da tortura."

Minha vida, porém, triste e insegura,
Está repleta de desinteresses...
Meus caminhos, tortuosos, lembram SS
Onde jamais encontro uma ventura!...

Nas tardes tristes, pálida, eu amuo...
Ante o desconhecido vem-me o medo
E o amanhã para mim é sempre incerto.

Frente a problemas simples, eu recuo,
De meu mundo interior faço segredo,
Sozinha vivo a vida num deserto...


[074]

Fiz tudo o que pediste... fiz loucura
Que não devia, não, jamais ter feito.
Porém, eu te queria satisfeito
Que entre nós não houvesse uma só agrura...

Toda vez que fazias uma jura
Acreditava em não achar defeito...
Vinhas depois, com novo preconceito
E eu de ti me sentia ainda segura...

Pensando bem, de ti fui uma escrava...
Sempre onde me querias eu estava
Numa obediência simples, pura, cega...

Nua, entreguei-te o corpo, a mente, a alma,
Mesmo sofrendo tanto eu era calma
Te fazendo feliz com minha entrega!


[077]

Fui teu pudim, o teu manjar de ameixa,
A tua sobremesa preferida!
Fui a essência vital de tua vida,
A tua oriental e doce gueixa!

E não tive de ti nenhuma queixa
Enquanto eu era tua e era a querida.
Mas depois que me deste a despedida,
Só desesperos a minh'alma enfeixa.

Fundas olheiras marcam os meus olhos...
Em meu caminho — solidão e abrolhos
Fazem que minha vida seja triste.

A tua ausência faz brotar o pranto
Em meus dias... e tudo é sem encanto
E sequer a esperança hoje me existe.


[085]

"Olhos nos olhos" a canção do Chico
Serve para eu lembrar perfeitamente
Que já tive do amor um sonho rico
E que me fez feliz, amante e ardente.

"Como vai suportar..." pensando fico
"Me ver feliz", saber que estou contente,
Que de tuas lembranças eu abdico
"E me pego cantando" num repente...

Porém, me pego olhando "atrás da porta"
"Teus cabelos, teu pêlo, teu pijama",
E uma saudade o coração me corta...

E só para mostrar que ainda sou tua,
Ficarei te esperando em minha cama
Com o corpo em fogo, totalmente nua...


[093]

De que valeu-se ser sua cadela,
Ser sua fêmea, estar sempre no cio,
Ter da volúpia um caudaloso rio
Ser sua égua atrelada numa sela?

De que valeu-me abrir minha cancela,
Da vergonha perder o íntegro brio,
Atender seu chamado de assobio,
Ter minha vida à sua paralela?

De que valeu-me a anulação completa
De taras, de vontades, de desejos,
E uma vida levar toda incorreta,

Se seu amor não foi mais que lampejos,
E se tinhas apenas como meta
Matar a sua fome com meus beijos?


[103]

Para mostrar que eu era a tua escrava,
A inicial de teu nome quis gravar
Em meu corpo e com ferro em rubra lava
Fui marcada. Assim quis perpetuar

Para sempre, da forma mais ignava,
Que eu era tua, tua, tua... (o luar
No quarto, sua luz tênue infiltrava)
E teu nome eu passei a carregar...

Essa tatuagem, hoje, a pele queima...
Esta inicial que foi minha Esperança
É hoje meu desespero e minha dor.

E como cicatriz profunda, teima
A avivar com furor minha lembrança,
..É tudo o que restou de nosso amor...


[112]

Tiveste-me da forma que querias:
Submissa, fiz todo e qualquer capricho,
E quanto mais de mim tu exigias,
Mais eu te amava como o amor de um bicho.

Mas agora me tratas como um lixo
E evitas minhas buscas-fantasias...
Alguns amigos dizem-me em cochicho
Que outras tens para as loucas heresias.

Podes ter outra mas me sinto tua...
Se me telefonares neste instante
Te esperarei completamente nua.

Vem me possuir que espero-te ofegante,
Com teus beijos de fogo me tatua
Pois bem sei que ainda sou a tua amante.


[113]

Por tua causa fui buscar a rima
Para entender o teu amor tão louco.
Se tudo o que te dei foi muito pouco,
Um outro amor buscar já não me anima.

Nem consideração e nem estima,
Muito mais o cantar que ficou rouco,
Nem o teu gesto tresloucado e amouco
Enaltecendo o amor como obra-prima...

Quando entreguei-te os meus primeiros versos,
Com o olhar perdido em pontos tão diversos
Elogiaste meus dotes de poetisa.

E os mesmos versos que tu leste um dia,
Hoje são partes de uma alegoria
Que tanto o coração me martiriza.


[137]

Eis o nosso Motel! Altar sagrado
Onde nosso romance teve início.
Onde tu me ensinaste o doce vício
Que o amor tem pressa para ser amado.

Hoje, no coração — como um resquício,
Relembro todo o sonho idolatrado:
— Fui tua Amada! foste meu Amado!
Sem que para isso houvesse sacrifício.

Era a cama redonda avermelhada,
Teto de espelho, sauna, hidromassagem,
Ai, loucura, ai, delírio, ai, meus desejos...

Hoje, sozinha, triste, abandonada,
Tudo mais me parece uma miragem,
Parecem pesadelos os teus beijos!


[149]

Passo noites e noites acordada
Apenas recordando, recordando,
Que ainda estou por ti apaixonada
E disposta a atender ao teu comando.

Um teu aviso me dizendo quando
E eu irei num instante à ordem dada.
— Enquanto a ordem não vem fico sonhando
No desespero desta madrugada...

Também sei muito bem que ainda me queres,
Que tens buscado em outras mil mulheres
As chamas do desejo que eu te dava.

Mesmo quebrado os elos da corrente,
De ti o meu amor se faz presente
E inda me sinto ser a tua escrava.


[150]

Eu sei que agora, relembrando fatos,
Eu passei acordada a noite inteira.
Reli diários, fui rever retratos,
E a saudade foi minha companheira.

Pensei melhor: não vou medir meus atos.
Não vou ser da tristeza companheira.
Vou mais cuidar de mim, vou dar-me tratos,
— Não penso ir ao convento, nem ser freira.

Vou bagunçar de vez meu coração:
E vou causar furor nesta cidade,
Tomei agora mesmo a decisão —

Que não venha ninguém neste revel,
Agora mesmo vou à liberdade
E te possuir num quarto de motel!

Û Ý ´ ¥ Ü * e-mail: elson fróes