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Antônio Tomás de Sales (Aracati CE 1868-1941)
Embora respeitado entre os sonetistas da terra e tendo sido eleito
"príncipe dos poetas cearenses", nunca publicou em livro e proibiu, por
cláusula testamentária, que os parentes o fizessem. Naturalmente alguém
da família iria desobedecê-lo, e, graças a uma sobrinha muito
mal-comportada, temos hoje acesso ao material do qual se oferece a
amostra abaixo.
CONTRASTE Quando partimos, no vigor dos anos, Da vida pela estrada florescente, As esperanças vão conosco à frente, E vão ficando atrás os desenganos. Rindo e cantando, céleres e ufanos, Vamos marchando, descuidosamente... Eis que chega a velhice de repente, Desfazendo ilusões, matando enganos! E é só então que vemos claramente (*) Quanto a existência é rápida e fugaz! E vemos que sucede exatamente O contrário dos tempos de rapaz: Os desenganos vão conosco à frente, E as esperanças vão ficando atrás! O PALHAÇO Ontem viu-se-lhe em casa a esposa morta e a filhinha mais nova tão doente! Hoje o empresário vai bater-lhe à porta, que a platéia o reclama impaciente. Ao palco em breve surge... pouco importa o seu pesar àquela estranha gente. E ao som das ovações que os ares corta, trejeita e canta e ri nervosamente. Aos aplausos da turba ele trabalha para esconder no manto em que se embuça a cruciante angústia que o retalha. No entanto, a dor cruel mais se lhe aguça e enquanto o lábio trêmulo gargalha, dentro do peito o coração soluça. VOLTANDO A CASA Passei um mês, um mês inteiro, fora Do meu lar, sem ouvir meus passarinhos, Sem ver o louro bando de amiguinhos Que aí deixei! Cruel, longa demora! Mas, afinal, eis-me de volta agora, E na ânsia de ver os coitadinhos, Que suspiram talvez por meus carinhos, Fustigo o meu corcel, que o chão devora. Avisto a casa além, dobro a tortura Que dela me separa... Oh! que ventura Eu sinto na alma ao ir-me aproximando! Chego ao portal, puxo o ferrolho e entro, E me recebem pela sala a dentro Crianças rindo e pássaros cantando. A MORTE DO JANGADEIRO Ao sopro do terral abrindo a vela, Na esteira azul das águas arrastada, Segue veloz a intrépida jangada, Entre os uivos do mar que se encapela. Prudente o jangadeiro se acastela Contra os mil incidentes da jornada; Fazem-lhe, entanto, guerra encarniçada O vento, a chuva, os raios, a procela. Súbito, um raio o prostra e, furioso, Da jangada o despeja n'água escura: E em brancos véus de espuma o desditoso Envolve e traga a onda intumescida, Dando-lhe, assim, mortalha e sepultura O mesmo mar que o pão lhe dera em vida. (*) Variante: Então, nós enxergamos claramente
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