vez primeira
o fruto recendia
da figueira persignada
e se fazia
o mistério do verbo
pela boca da poesia
uma palavra
entretanto (entre tantas)
resguarda-se na infância
transubstanciada
° ° °
verbo sôfrego
aviva o lixo dos séculos:
signos bacantes
símbolos genuflexos
enquanto as musas em febre lambem
as tetas opulentas do poema
° ° °
havia um porto
antes
ao alcance da vista
um ponto
onde as naus
suspendiam viagem
as velas arfavam
desenfunadas
e sonhavam
a lua sobre o mar
era um sabre
aparando a água
havia um porto
antes
ao alcance do corpo
(um ponto
onde hoje atraco a saudade
e mais nada)
° ° °
renda de espuma
borbulha nos olhos
dos peixes mortos
o salitre ácido
pouco a pouco
enferruja a tarde
° ° °
a escrita
(como nos estudos de Leonardo)
é corpo dissecado
os músculos saltam dos traços
marcando a delicada anatomia
do rosto que a vida grafa
no desenho tosco:
o engenho do pensamento
nudez de nervos na página
° ° °
a palavra imprevista na mesa
entre a faca e o prato
flor
à margem do rosto e da página
fruto
onde um verme oculto
quem sabe
corrói o cerne
e a carne
° ° °
a tinta preta escorre
da pálida página
pelas pernas
manchando meias e olhos
por trás da rasura
a memória sonda as raízes
dos verbos irregulares
dever de casa: preencher
o espaço que as reticências abrem
° ° °
congelada sílaba
sim-não desde sempre
para sempre
(amor plenilúnio
em pleno junho
nunca pensei que)
entanto
a palavra do Oráculo
vigia a Escritura e a Sorte
° ° °
se me perguntarem por
que trago esta cic
atriz no olho d
irei que o tempo me d
eu esta infanta triste
que tanto pesa e
canta na face
para ficar com
migo sempre a
penas por capricho sem m
ais intenção do que os
tentá-la entre o que
de mim persite
no caminho
° ° °
aristotélica luta
no corpo a corpo da sintaxe
(sujeito cópula predicado)
a erótica do texto
no sentido imperfeito
do objeto indizível
platoicônico conceito
da poesia: ad infinitum
exercício do organogozo
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